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19 de Abril de 2024
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    Portaria 742/12 não se aplica aos Auditores Fiscais

    ANTÔNIO MEDEIROS DOS SANTOS
    Diretor de Organização e Mobilização Sindical

    A Portaria 742 de 04 de Maio de 2012 tem como objetivo maior o controle da jornada de trabalho dos servidores e empregados do Estado por intermédio de controle de ponto, inclusive com a utilização de catraca eletrônica. Diante disto, muito se tem cogitado quanto à aplicação desta norma para os (as) Auditores (as) Fiscais do Estado da Bahia. Deste modo, análises são processadas em torno de outras Portarias, de Decretos, de Circulares, de artigos do Estatuto dos Servidores do Estado da Bahia e assim por diante. Entretanto, parece que ainda não se tornou claro para nossa categoria que tal normatização não nos atinge, em razão das circunstâncias que são descritas nos parágrafos seguintes.
    De pronto, cabe invocar o que preceitua o inciso XVIII do Artigo 37 da Constituição Federal, isto é, a administração fazendária e seus servidores fiscais terão, dentro de suas áreas de competência e jurisdição, precedência sobre os demais setores administrativos, na forma da lei. Podemos até inferir que o vocábulo precedência, neste contexto, apresenta-se como demasiadamente amplo e de entendimento dúbio, mas, pelo menos o professor J. Cretella Júnior, ao referir-se ao colega Toshio Mukai (cf. Administração Pública na Constituição de 1989, São Paulo, 1989, ed. Saraiva, p. 56), deixa claramente transparecer que a citada expressão deve ser entendida no sentido de que a Administração Fazendária e seus servidores deverão ter privilégios de tratamento pela lei, no tocante ao exercício das suas atribuições, em função dos privilégios e garantias de que goza o crédito público.
    Poderia, em uma superficial análise, parecer que o entendimento de acordo com o que dispomos no parágrafo anterior seria uma forma de agredir o Princípio Constitucional da Isonomia, conforme prevê o caput do art. da Constituição Federal. Assim, trazemos à baila os ensinamentos do professor Miguel Reale (Lições preliminares de Direito. 2002) quando diz que, sob a ótica de Dante Alighieri, O Direito é uma proporção real e pessoal, de homem para homem, que, conservada, conserva a sociedade; corrompida, corrompe-a.
    Continuando, comenta ainda o citado jurista que, na referida definição, observamos o termo proporção, ou seja, não se trata de uma igualdade absoluta, mas sim relativa, proporcional. Entendemos que as circunstâncias nos casos concretos, quando da aplicação do Direito devem ser avaliadas, a fim de buscarmos a igualdade.
    Se o propósito do Direito é regular as relações humanas, trazendo segurança, segundo os critérios de Justiça, conforme ensina Paulo Nader, inferimos que no conceito de igualdade já está embutido o conceito de equidade, de proporcionalidade, qual seja: tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais na medida de suas desigualdades.
    Não é despiciendo acrescentar ainda que, conforme a Constituição Federal, no inciso XXII do já citado art. 37, as administrações tributárias da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, consideradas atividades essenciais ao funcionamento do Estado, exercidas por servidores de carreiras específicas, terão recursos prioritários para realização de suas atividades.
    Destarte, neste ponto, cabe questionar se os (as) Auditores (as) Fiscais, profissionalmente, são desiguais ou não. Ressalta-se que, em nenhum momento, estamos a desconsiderar a importância e necessidade de todas as demais funções que fazem girar a máquina estatal. Apenas advogamos pelo fato de que, por variados motivos, os quais devem sempre estar em consonância e a serviço dos legítimos interesses sociais, alguns agentes públicos apresentam traços que lhe são peculiares, como é o caso dos Militares, Policiais Civis, Magistrados (as), Promotores (as), Procuradores (as) de Estado e, entre outros, os Auditores (as) Fiscais.
    No caso dos (as) Auditores (as) Fiscais, podemos citar como traços peculiares:
    - o impedimento que se registra quanto ao exercício da advocacia previsto no inciso VII do art. 28 da Lei nº 8.906, de 04 de julho de 1994, que dispõe sobre o Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil OAB;
    - a proibição quanto ao exercício da função de Contador a qual, juntamente com a de Advogado, é vedada, conforme inciso XXIII do art. 14 da Lei 8.597, de 28 de abril de 2003, que institui o Código de Ética dos Servidores do Grupo Ocupacional Fisco da Secretaria da Fazenda do Estado da Bahia;
    - a profundidade intelectiva e abrangência que caracteriza as atividades dos (as) Auditores (as) Fiscais do Estado da Bahia conforme se depreende de uma simples análise do teor constante do art. da Lei 8.210 de 22 de março de 2002 que reestrutura o Grupo Ocupacional Fisco da Secretaria da Fazenda do Estado da Bahia;
    - a continuidade da condição de Auditor (a) Fiscal que acompanha este (a) agente mesmo quando fora da repartição pública, haja vista os impedimentos citados e as constantes situações de perigo e assédio que caracterizam a função, registrando-se, inclusive, não raros casos de agressão que, em algumas situações, desembocaram no resultado morte;
    - a indeterminação da jornada de trabalho, pois, independentemente de estar este (a) profissional no desenvolvimento de serviço interno ou externo o (a) mesmo (a) executa tarefas que envolvem atividade intelectual de pesquisa e produção de manifestações técnico-científico, além de frequentes deslocamentos para atuação.
    Outros aspectos poderiam ser levantados, mas acreditamos que os apontados apresentam-se como suficientes para demonstrar o quanto os (as) Auditores (as) Fiscais registram traços que lhe identificam como integrantes do conjunto composto por profissionais considerados como de Carreira de Estado, isto é, profissionais que desenvolvem atividades imprescindíveis ao Estado, as quais não podem ser delegadas a terceiros e, por consequência, assumem, em benefício da sociedade como um todo, ônus que não são comuns à grande maioria dos servidores públicos.
    Neste jaez, devemos trazer a lume a Ementa transcrita a seguir, que foi citada no Processo nº 22921-
    JUSTIÇA FEDERAL SEÇAO JUDICIÁRIA DO ESTADO DE GOIÁS 2ª VARA.
    Ementa
    ADMINISTRATIVO. SERVIDORES. PROCURADORES AUTÁRQUICOS.
    CONTROLE ELETRÔNICO DE FREQUÊNCIA E PONTUALIDADE.
    INCOMPATIBILIDADE COM OS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇAO
    GERENCIAL. EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 19/98.
    1. "O controle eletrônico de frequência e pontualidade para procuradores autárquicos é incompatível com a natureza de suas atribuições e com os princípios da administração gerencial (eficiência e controle de resultados), instituídos pela Emenda Constitucional n.19/98." (AMS 1998.01.00.058772-9/PI. Rel. Juiz Plauto Ribeiro, Rel. Convocado Juiz João Batista Gomes Moreira in DJ de 27.11.2000, p. 32).
    2. O ato impugnado representa, a bem da verdade, mais uma amostra de uma Administração burocratizada, apegada a rotinas formalistas, destituídas de utilidade e que têm por escopo dificultar a atuação de seus agentes, com prejuízo a todos. Administração moderna e socialmente útil equivale a Administração livre para agir nos termos da lei. 3. Apelo e remessa oficial a que se nega provimento (TRF1, MAS 199801000531250, Relator (a) JUIZ NEY BELLO (CONV), PRIMEIRA TURMA SUPLEMENTAR, DJ DATA: 11/03/2002 PÁGINA: 130)
    Tomando de empréstimo as assertivas constantes do referido decisum da lavra do Juiz Federal, Dr. Jesus Crisóstomo de Almeida, e perpetrando as adequações cabíveis ao nosso caso, deve ser expresso que poder-se-ia objetar que o julgado paradigma não se aplica à situação em epígrafe, pois tratou de carreira diversa. Não obstante, as atividades se enquadram como aquelas que se caracterizam como de gerenciamento de serviços públicos relevantes, sendo os argumentos aplicáveis às duas situações. Ademais, a atividade de auditoria fiscal é menos ainda passível de ser tratada burocraticamente, considerando as suas peculiaridades técnicas, que envolvem inclusive o deslocamento para cumprimento de várias ações in loco.
    Da situação exposta, parece evidente que não há razoabilidade em se submeter agentes públicos que exerçam atividade de gerenciamento, fiscalização e constituição do crédito público a rígido controle de horário.
    Ressalte-se que não se está a afastar a necessidade de acompanhamento da eficiência dos Auditores (as) Fiscais do Estado da Bahia, mas tal supervisão deve ser feita com base em elementos de produção quantitativa e principalmente qualitativa compatível com a relevância das funções exercidas por tais profissionais. É, portanto, desarrazoada a medida de controle de horário dos mesmos por meio de ponto eletrônico, o que implica no afastamento da aplicação da Portaria nº 742/12, para as referidas autoridades administrativas.
    Cabe salientar que também não estamos sendo contrários às medidas de segurança que porventura venham a ser implantadas pela Administração Pública. Contudo, o controle de ingresso dos Auditores Fiscais nas Repartições, onde os mesmos desenvolvem suas atividades profissionais, deve ser feito, quando necessário, através da apresentação da sua Carteira Funcional.
    Por fim, não é demais acrescentar que se dos profissionais em análise for exigido controle de ponto, nos moldes da referida Portaria 742/12, sobremaneira no que se refere a exigência de Auditores (as) Fiscais terem seu acesso à Repartição controlado por catracas eletrônicas, certamente, não apenas pelos aspectos de ordem moral e psicológica, mas, de forma acentuada, pelos aspectos administrativos e de produção, as atividades sofrerão conturbação e até justificável redução, o que só redunda em prejuízo para toda a coletividade baiana.

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